Em um condomínio no interior de São Paulo, os arquitetos da Urbem definem sucessões de planos que se intercalam para conter e proteger uma casa mirante.
O condomínio residencial Monte Alegre, em Piracicaba, fica próximo a uma área tombada da cidade chamada Usina Monte Alegre. De um de seus lotes é possível avistar as chaminés da usina, a capela São Pedro, com obras de Alfredo Volpi, e uma área de preservação permanente. O proprietário desse terreno de 1739,09 m2, fruto da união de três lotes, pediu a Urbem Arquitetura uma casa mirante, onde a partir de todos os espaços pudesse desfrutar da vista permanente. Para atender a essa solicitação, os arquitetos direcionaram a casa para face norte, pois a melhor vista todos os ambientes voltam-se exatamente para a face de maior insolação. Essa implantação exigiu matérias primas de baixa condução térmica e dispositivos de proteção solar que garantissem o conforto térmico necessário.
Para garantir face norte aos ambientes, e liberar uma terça parte do terreno para eventual comercialização, o projeto definiu dois blocos ortogonais que se cruzam, formando térreo e primeiro andar. O programa segue a lógica de um sobrado: áreas sociais como cozinha, lazer, estar, jantar e escritório organizam-se no térreo enquanto que três suítes e sala intima distribuem-se no andar superior. No ponto do cruzamento foi definida a circulação vertical e a entrada da casa, protegida por um painel curvo de madeira. Essa dinâmica criou coberturas para os ambientes sociais e tetos verdes que absorvem a luz solar e servem aos espaços íntimos: um desses terraços é um verdadeiro mirante, circundado por bancos de concreto e acessado a partir da sala superior. Encaixado nesse volume a cobertura da área gourmet, posicionada logo a frente dos caixilhos da suíte máster, sustenta espécies vegetais que florescem. “Essa laje propicia a criação de um jardim de flores, que da suíte do casal, mistura-se com o verde da paisagem.”, explica o arquiteto Marcelo Guidotti, da Urbem.
A implantação também condicionou a distribuição das suítes ao longo do volume superior e criou gradientes de proteção solar nos ambientes sociais do térreo. As áreas de estar e jantar são contida entre grandes portas de vidro em ambos os lados que permitem ventilação cruzada. Como a sala é estrategicamente recuada em relação ao terraço, além do vidro, toldos protegem a varanda e barram ainda mais a entrada de luz solar. No andar superior, grandes portas pantográficas feitas de chapa de alumínio micro perfurado protegem as portas envidraçadas, permitem ventilação , a visão e barram a luz e o calor: quando abertas suas abas também funcionam como brises. Na porção mais crítica do volume superior, a face da suíte máster voltada para a face oeste, os arquitetos optaram por um revestimento formado por placas de gesso acartonado, painel de câmara frigorífica e chapa de alumínio composto. “Esse conjunto é ultra eficiente contra o calor da forte incidência solar.”, explica Marcelo. A solução de cobertura do volume superior completa o sistema de proteção solar e reforça o partido industrial: telhas tipo sanduiche zipadas abrigam domos de iluminação posicionados sobre os banheiros das suítes.
A arquitetura da casa conceitua-se de forma contemporâneo quase industrial, a exemplo da Usina que contempla. A maior parte das lajes é pré fabricada, revestida de gesso, exceção às lajes maciças de concreto sobre a área gourmet e escritório, mantidas aparentes. Vigas metálicas parafusadas a paredes de concreto, e tirantes, todos aparentes, auxiliam a sustentar a implantação em cruz. A suíte do casal flutua sobre a garagem, em balanço, atirantada por perfis tubulares metálicos que também permitem o grande vão livre da sala social. As esbeltas vigas pintadas de verde acentuam a horizontalidade da obra, e projetam-se sobre a área social, formando uma faixa de iluminação zenital. As tubulações de água de chuva e esgoto também correm aparentes pelas fachadas.
Os grandes panos verticais de concreto atravessam os volumes, com marcações e furações aparentes: o detalhe fica por conta da resina acrílica que preenche os furos e reflete a luz. Aliás, apesar da robustez dos paramentos, a casa revela-se no apuro dos detalhes de projeto. A viga I de sustentação da escada embute entre cada piso uma luminária. O mármore travertino que recobre o piso de todo o térreo foi paginado seguindo as marcações do concreto das paredes, assim como o alumínio composto que reveste a parede da suíte master. No andar superior, o forro de gesso é sulcado de maneira a revelar as mesas das vigas metálicas em composição com a madeira do assoalho que sobe pela parede do bloco formado pelas duas suítes menores. As portas brancas tem batentes de madeira piso teto, que formam bandeiras.